A Fisiopatologia da Cefaleia Tensional na Medicina Tradicional Chinesa: Além da Tensão Muscular
- Dr. Sergio Akira Horita

- há 4 dias
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Na clínica, a cefaleia do tipo tensional (CTT) é frequentemente associada ao estresse e à contração da musculatura pericraniana. A Medicina Tradicional Chinesa (MTC) concorda, mas aprofunda a questão, perguntando: qual desequilíbrio interno permite que o estresse se manifeste como uma contração muscular crônica e dolorosa?
A resposta reside na compreensão da fisiopatologia energética, que classifica a CTT não como uma entidade única, mas como a manifestação de padrões de desarmonia específicos, principalmente relacionados ao Fígado (Gan) e ao Baço (Pi).
O Princípio Central: Estagnação do Qi
A descrição clássica da CTT – uma dor em pressão, aperto ou "faixa" – é a manifestação prototípica da Estagnação do Qi. O Qi, ou energia vital, deve fluir livremente pelos meridianos para que haja saúde. Quando seu fluxo é obstruído, ele gera uma sensação de distensão, pressão e dor surda. Os meridianos mais afetados na CTT são os da Vesícula Biliar (Shaoyang) e da Bexiga (Taiyang), que governam as laterais da cabeça, a região occipital e o pescoço (MACIOCIA, 2007).
O diagnóstico diferencial na MTC, portanto, busca identificar a causa raiz dessa estagnação.
1. Estagnação do Qi do Fígado (Gan Qi Yu Jie) – O Padrão Mais Comum
Fisiopatologia: O sistema funcional do Fígado (Gan) é o grande responsável por garantir o fluxo suave e livre do Qi em todo o corpo. Ele é extremamente sensível a fatores emocionais, especialmente estresse crônico, frustração, raiva reprimida ou preocupação excessiva. Sob estresse, a função do Fígado de "espalhar" o Qi é inibida, levando à sua estagnação. Essa estagnação se manifesta como tensão muscular, particularmente nos ombros e pescoço (a "zona de aterrissagem" do estresse), e dor em pressão na cabeça.
Quadro Clínico: Dor de cabeça em aperto ou faixa, frequentemente bilateral. O sintoma chave é a sua clara correlação com o estresse emocional, piorando em dias de maior pressão e melhorando com a distração ou o relaxamento. É comumente acompanhada de tensão visível nos ombros e pescoço, irritabilidade, suspiros frequentes e, em mulheres, tensão pré-menstrual.
Princípio de Tratamento: Acalmar o Fígado e mover o Qi estagnado.
2. Deficiência de Qi e Sangue (Qi Xue Liang Xu) – O Padrão de Base Crônico
Fisiopatologia: Enquanto o padrão anterior é de "excesso" (bloqueio), este é um padrão de "deficiência". O sistema do Baço (Pi) é responsável por transformar os alimentos em Qi e Sangue (Xue). O excesso de trabalho, a alimentação irregular ou a preocupação crônica podem enfraquecer o Baço, levando a uma produção insuficiente de Qi e Sangue. Sem nutrição adequada, os músculos se tornam cronicamente cansados, fracos e doloridos, sendo incapazes de sustentar a cabeça adequadamente e tornando-se facilmente tensos.
Quadro Clínico: Dor de cabeça surda, persistente e latejante, que caracteristicamente piora ao final do dia ou após esforço mental ou físico. A dor melhora com o repouso. É acompanhada de fadiga geral, cansaço, tontura ao se levantar, palidez, falta de apetite e dificuldade de concentração. A tensão no pescoço é mais uma sensação de "cansaço" e "fraqueza" do que de contração aguda.
Princípio de Tratamento: Tonificar o Qi, nutrir o Sangue e fortalecer o Baço.
Integração Clínica: A Combinação de Padrões
Na prática, especialmente em pacientes crônicos, é comum encontrar uma combinação dos dois padrões: uma Deficiência de Qi e Sangue de base, que deixa o indivíduo enfraquecido e vulnerável, sobre a qual se instala uma Estagnação do Qi do Fígado quando o paciente é submetido ao estresse diário.
Essa visão integrada explica por que o tratamento com acupuntura para CTT crônica vai além de simplesmente agulhar os músculos tensos (tratar o "galho"). O tratamento eficaz deve, simultaneamente, mover o Qi do Fígado para aliviar a tensão aguda e fortalecer o Baço e nutrir o Sangue para tratar a deficiência de base e prevenir a recorrência (tratar a "raiz").
Referências Bibliográficas
FOCKS, C.; REICHSTEIN, C. Atlas de Acupuntura. 2. ed. Barueri: Manole, 2008.
MACIOCIA, G. Os Fundamentos da Medicina Chinesa: Um Texto Abrangente para Acupunturistas e Fitoterapeutas. 2. ed. São Paulo: Roca, 2007.



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