top of page
Foto do escritorDr. Sergio Akira Horita

Infiltração do ponto gatilho miofascial - parte 2 - uso de anestésicos locais e solução salina

Atualizado: 21 de ago. de 2023


AS INFORMAÇÕES A SEGUIR SÃO EDUCATIVAS SERVINDO COMO FERRAMENTA TEÓRICA PARA O APRENDIZADO DA TÉCNICA DE INFILTRAÇÃO. PARA USO EM PACIENTES, HÁ NECESSIDADE DE TREINAMENTO MÉDICO PRÁTICO SUPERVISIONADO POR PROFISSIONAIS MAIS EXPERIENTES.


Princípios básicos dos anestésicos locais

A estrutura molecular de todos os anestésicos locais consiste em 3 componentes: (a) anel aromático lipofílico, (b) ligação intermediária de éster ou amida e (c) amina terciária. Cada um desses componentes contribui com propriedades clínicas distintas para a molécula (Figura 1).

Figura 1 - estrutura química dos anestésicos locais. Adaptado de: Becker DE, Reed KL. Local anesthetics: review of pharmacological considerations. Anesth Prog. 2012 Summer;59(2):90-101; quiz 102-3. doi: 10.2344/0003-3006-59.2.90. PMID: 22822998; PMCID: PMC3403589.


Os anestésicos locais variam em sua potência, permitindo concentrações que variam tipicamente de 0,5 a 4%. Isso é em grande parte o resultado de diferenças na solubilidade lipídica, que aumenta a difusão através das bainhas nervosas e membranas neurais. Essa propriedade é determinada pelo anel aromático e suas substituições, juntamente com aquelas adicionadas à amina terciária.

Os anestésicos locais atuam ligando-se aos canais de sódio dependentes de tensão nas membranas nervosas. Os anestésicos locais interagem em sua forma ionizada com os aminoácidos fenilalanina e tirosina, o que leva a um bloqueio do influxo de sódio.

Em altas concentrações, outros canais iônicos também são bloqueados.

O bloqueio da permeabilidade ao sódio leva à supressão da despolarização e da propagação da onda de excitação. Isso interrompe a condução dos sinais de dor (Figura 2).

Figura 2 - ação do anestésico local. Um anestésico local injetado existe em equilíbrio como sal quaternário (BH+) e base terciária (B). A proporção de cada um é determinada pelo pKa do anestésico e pelo pH do tecido. A base lipossolúvel (B) é essencial para a penetração tanto no epineuro quanto na membrana neuronal. Uma vez que a molécula atinge o axoplasma do neurônio, a amina ganha um íon hidrogênio, e essa forma quaternária ionizada (BH+) é responsável pelo bloqueio real do canal de sódio. O equilíbrio entre (BH+) e (B) é determinado pelo pH dos tecidos e pelo pKa do anestésico (pH/pKa). Adaptado de: Becker DE, Reed KL. Local anesthetics: review of pharmacological considerations. Anesth Prog. 2012 Summer;59(2):90-101; quiz 102-3. doi: 10.2344/0003-3006-59.2.90. PMID: 22822998; PMCID: PMC3403589.


Os seguintes fatores afetam o tempo que o anestésico local permanece no local de aplicação e o efeito:

  • o valor de pH determina o nível de lipossolubilidade: quanto mais alto o valor de pH fisiológico de 7,4, menos eficaz é o anestésico local (por exemplo, inflamação),

  • perfusão local,

  • hidrólise enzimática com anestésicos locais do tipo éster.

Na corrente sanguínea, os anestésicos locais do tipo éster, como a procaína e a tetracaína, são divididos pela colinesterase plasmática. Os produtos separados são ineficazes como anestésicos locais e não são tóxicos em suas concentrações resultantes. A degradação no fígado é de importância secundária.

Os anestésicos locais do tipo amida, como a lidocaína, são principalmente desalquilados ou hidroxilados oxidativamente e hidrolisados enzimaticamente pela carboxiesterase, localizada no retículo endoplasmático.

Os anestésicos locais do tipo amida são metabolizados mais lentamente (meia-vida entre 1,5 e 3,5 h) em comparação com os anestésicos locais do tipo éster (por exemplo, a procaína tem uma meia-vida de 0,5-1 h) no plasma e nos tecidos.

Tabela 1 - Aplicação clínica dos anestésicos locais (com ou sem adrenalina). As dosagens máximas são apenas recomendações. A duração do efeito depende da técnica de bloqueio e da quantidade de anestésico local injetada. Adaptado de: Irnich D. Myofascial Trigger Points. Comprehensive diagnosis and treatment. Churchill Livingstone. 2013


Os anestésicos locais também podem ser classificados por sua duração de efeito:

• curta duração: procaína - 30–60 min,

• duração média: lidocaína, mepivacaína, prilocaína - 60–120 min,

• longa duração: ropivacaína e bupivacaína - até 400 min.


Escolha do anestésico local

Devido à sua comprovada baixa miotoxicidade, recomendamos lidocaína 0,2–0,5%, mepivacaína 0,2–0,5%, prilocaína 0,2–0,5% e bupivacaína 0,125% ou menos (uma dosagem mais alta é potencialmente miotóxico). Devido à baixa lipofilia dos anestésicos locais tipo ésteres, a procaína e a tetracaína têm o menor nível de miotoxicidade, embora se estime que os ésteres tenham um potencial alérgico mais alto. Baixas concentrações de anestésicos locais são geralmente suficientes para obter o efeito desejado. Uma diluição elevada também evita afetar as fibras motoras.

Caso seja a primeira injeção de anestésico no ponto gatilho, por razões de praticidade, um anestésico local de curta duração deve ser usado (por exemplo, procaína, lidocaína, prilocaína). As vantagens são o início rápido do efeito (permitindo revisão rápida) e a duração mais curta do efeito (o que significa manejo seguro no ambiente ambulatorial).

Se forem realizadas injeções terapêuticas, os anestésicos locais de curta e longa duração podem ser combinados. Isso garante um rápido início de efeito que dura muito tempo, com dessensibilização mais longa.


Efeitos colaterais

Miotoxicidade

Os anestésicos locais são a principal opção para a infiltração dos pontos gatilhos miofasciais, mas eles pode ser tóxicos para as células musculares.

Inicialmente, os sistemas de membrana intracelular são afetados com subsequente formação de edema nos miócitos, como consequência pode levar a áreas de necrose, porém sem sequelas por causa da regeneração.

Todos os anestésicos locais podem ter efeitos miotóxicos, embora o potencial miotóxico de cada anestésico local varie. Em testes com animais, a procaína causa apenas alterações estruturais mínimas, enquanto os piores danos foram observados com a bupivacaína (em altas concentrações). Fisiologicamente, a miotoxicidade é baseada em uma concentração intracelular patologicamente aumentada de cálcio livre (Ca2+) nos monócitos. Os monócitos têm sido colocados como fundamentais no processo de reparo do músculo esquelético. Muitos anestésicos locais induzem a liberação de Ca2+, dependendo da concentração, do retículo sarcoplasmático e, ao mesmo tempo, impedem a recaptação de Ca2+. Este efeito depende da lipofilia e da configuração estereoisomérica. O significado clínico da miotoxicidade induzida por anestésicos locais é controverso, pois o dano muscular tóxico é extremamente raro de ser relatado após a infiltração dos pontos gatilhos miofasciais. Os depósitos de Ca2+ podem ser melhor evitados com procaína.


Efeitos sistêmicos tóxicos

Os efeitos adversos sistêmicos ocorrem como resultado de superdosagem ou injeção intravascular inadvertida. Eles ocorrem principalmente como distúrbios no sistema nervoso central ou no coração. Os distúrbios do sistema nervoso geralmente são encontrados inicialmente e os distúrbios cardiovasculares geralmente não ocorrem até que as concentrações séricas sejam mais altas.

Figura 3 - Concentrações séricas aproximadas e influências sistêmicas da lidocaína. Adaptado de: Becker DE, Reed KL. Local anesthetics: review of pharmacological considerations. Anesth Prog. 2012 Summer;59(2):90-101; quiz 102-3. doi: 10.2344/0003-3006-59.2.90. PMID: 22822998; PMCID: PMC3403589.


Neurotoxicidade

Em experimentos com animais, altas concentrações de anestésicos locais podem danificar o tecido nervoso. No entanto, isso não é esperado desde que sejam usadas as concentrações clínicas usuais.


Alergias

As alergias ocorrem muito raramente. Estes são mais comumente descritos para anestésicos locais do grupo éster. Com anestésicos locais tipo amida, foram descritas alergias aos estabilizadores adicionados (por exemplo, éster metílico do ácido para-hidroxibenzóico).

As reações alérgicas podem ocorrer como dermatite alérgica, ataques de asma ou choque anafilático.


Reações vasovagais

As reações vasovagais podem ocorrer com qualquer método de coleta de sangue ou injeção e devem ser distinguidas das reações alérgicas. Como profilaxia, os pacientes devem ser tratados deitados.


Dosagem

Uma quantidade de cerca de 0,2 a 0,5mL deve ser usada para infiltrar cada ponto gatilho miofascial, de modo que, mesmo que 10 a 15 pontos gatilhos sejam injetados, não haja perigo de exceder a dose total segura.


Solução salina fisiológica

A solução salina a 0,9% foi utilizada para o tratamento em alguns estudos, mas seus efeitos não foram similares ao uso dos anestésicos locais. Uma injeção com solução salina fisiológica deve sempre ser considerada se o paciente for intolerante ou tiver alergia aos anestésicos locais.


Referências bibliográficas:

  1. Becker DE, Reed KL. Local anesthetics: review of pharmacological considerations. Anesth Prog. 2012 Summer;59(2):90-101; quiz 102-3. doi: 10.2344/0003-3006-59.2.90. PMID: 22822998; PMCID: PMC3403589.

  2. Hammi C, Schroeder JD, Yeung B. Trigger Point Injection. [Updated 2022 Nov 25]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK542196/

  3. Irnich D. Myofascial Trigger Points. Comprehensive diagnosis and treatment. Churchill Livingstone. 2013

  4. Nouged E, Dajani J, Ku B, Al-Eryani K, Padilla M, Enciso R. Local Anesthetic Injections for the Short-Term Treatment of Head and Neck Myofascial Pain Syndrome: A Systematic Review with Meta-Analysis. J Oral Facial Pain Headache. 2019 Spring;33(2):183–198. doi: 10.11607/ofph.2277. Epub 2019 Mar 20. PMID: 30893405.

  5. Urits, I., Charipova, K., Gress, K., Schaaf, A. L., Gupta, S., Kiernan, H. C., … Viswanath, O. (2020). Treatment and Management of Myofascial Pain Syndrome. Best Practice & Research Clinical Anaesthesiology. doi:10.1016/j.bpa.2020.08.003

40 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comentários


bottom of page